A última médica com quem me consultei me orientou enfaticamente: você precisa dar um jeito de controlar a maneira como maneja o stress, que na vida sempre vem um novo; resolve um, vem doze. E, sim, o stress gera reações em cada centímetro desse corpo, ao mesmo tempo que pode soar como um mérito meio ridículo. Fiz, tensionei ao extremo, ocupei tantas lacunas de tempo, me investi. Tem esse stress de sobrecarga, claro, mas tem também as irritações mais cotidianas.
A prestação de contas me irrita, as regras que não escolhi e não compactuo me irritam, a insistência diante da minha negativa me irrita, a sobrecarga também me irrita!, mas a inação me irrita, o tédio, a falta de aventuras me irrita. E o que não me irrita diretamente, me esgota, fico exausta; as opiniões impopulares, a perseguição do pensamento de manada, assuntos que, enfim, sequer consigo pensar direito sobre. Um pouco a noção de recalque, fingir que se esquece de umas muitas coisas. Eu tenho fingido que esqueci desses grandes temas que me interessam só para não ser oprimida pelo investimento (mental, psíquico, de tempo, enfim) que eles demandam. Ah, e a exaustão também é extremamente irritante.
Em “sair de casa já é se aventurar”, Emanuel e Flor comentam um poucos sobre o quanto a gente inventa estresses na fantasia de sair para encontrar seu “verdadeiro eu”. São buscas que parecem precisar atravessar oceanos, atualmente, e o fracasso é “ficar em casa”. A casa pode ser sua cidade, seu país, a casa dos seus pais, o que couber na sua realidade. Mas sempre parece que faz muito mais sentido o novo, o extremo, que é onde podemos provar e desenvolver coragem. Vi (ou revi, nem tenho certeza) Serviço de Entregas da Kiki (Estúdio Ghibli) recentemente. Em uma cena, logo no começo, Kiki conversa com outra bruxa na noite que sai de casa (contexto: nesse micro universo, é tradição das bruxas passar um ano em treinamento fora de casa) que diz a ela estar terminando seu treinamento e mal pode esperar para voltar mais confiante. Às vezes, penso nisso: que sair é ter uma brecha para desenvolver a confiança (enquanto ninguém estiver olhando?) e voltar. Talvez um jeito de adiar seu compromisso em construir sua confiança com o que você tem agora. Agora pode ser um momento meio assustador.
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Estressa se ver debilitado em algo importante quando se pratica aquilo a algum tempo. É mais desagradável do que ser (obviamente) inabilidoso em algo novo. Gosto da noção de uma espécie de desenvolvimento colateral para amenizar algumas frustrações, e envolve não praticar aquilo diretamente, mas fazer alguma outra coisa que ajude a melhorar as habilidades que aquilo te demanda. A gente some e volta, mas o processo nunca pára. Me lembro da primeira vez que passei um período longo sem desenhar no papel, e me dediquei à ilustração digital. Eu não pausei a prática no último traço do lápis, só a desloquei para outro lugar. A ilustração digital melhorou meu desenho à mão, e sinto que são esses os saltos que precisamos incorporar nas noções de “estagnação” que tanto podem perturbar. Se conseguir fazer aquele encaixe, traçar relações, a coisa anda um tiquinho.
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O ano tá voando foi, muitas vezes, um comentário hiperbólico, solto pelo mundo, sem tanto sentido ou valor. Agora, já vejo como real demais, com um tantinho de medo. Preencher cada espaço de tempo tem esse efeito acelerado, e já é quase Natal, por assim dizer. No dentista, algumas semanas atrás, ele soltou o comentário: depois dos trinta, o tempo passa um tanto diferente; e depois dos quarenta, mais ainda. Não sei de que tipo de diferente se trata, mas evito querer saber também.
Sinto que ocupo ao máximo meu tempo porque o prazer de realizar eu sei usufruir, enquanto o prazer de parar ou de existir por momentos contemplando o mundo (a vida) sem interferências ou edições me assusta por ser real demais e, logo, perto demais da morte. E não dá pra sabermos demais que vamos morrer, diria Ana Suy (e, provavelmente, todos os psicanalistas do mundo). Pensar no tempo gera stress demais.
Como você lida com seu stress? Eu, ocasionalmente, escrevo descompromissada. Assim como Taís Bravo, “retomar contato com a minha magia, isto é, com um uso da linguagem não necessariamente produtivo (ou lucrativo) é uma necessidade vital”, e passar um tempo sem escrever murcha meus ânimos.
Um beijo,